domingo, 13 de março de 2011

Depoimento de um prisioneiro no Tarrafal

      O campo do Tarrafal resume-se a um rectângulo de arame farpado, com 750 metros de perímetro, no meio de uma planície que se estende das montanhas até ao mar, e fica plenamente isolado do mundo exterior. Durante os primeiros dois anos, dormíamos doze homens numa tenda, apenas tendo um candeeiro de petróleo. Durante nove meses do ano as tendas enchiam-se de pó trazido pelo vento. O calor e a chuva tropical depressa começaram a apodrecer a lona, e, durante a estação das chuvas, lutávamos contra a exaustão e a fadiga numa tentativa vã de proteger as nossas camas. Mas pela manhã tínhamos sempre a sensação de estar num navio de escravos que acabava de escapar a um furacão (…)
      Alcunhámos o capitão Reis de «Arame Farpado», porque ameaçava constantemente transformar o campo numa «prisão ao ar livre», só com arame farpado a «proteger-nos». «Vocês vão morrer como moscas», era outra das suas ameaças. E começou a ser confirmada a 20 de Agosto de 1937.
      Apenas seis dos presos não foram atacados pela malária, nem uma única injecção de quinino nos foi aplicada, nem um comprimido nos deram. Um preso, Joaquim Faustino de Campos, chamou a atenção do comandante de campo para as consequências que podiam advir de uma tão grave situação. A resposta foi o «segredo». Ninguém ou nada induzia o médico ou o comandante a dar remédios.
      Seis dos nossos companheiros morreram em 25 e 26 de Agosto de 1937.                                                                  

Pedro Soares in «Carme Carvalhas, 48 anos de Fascismo em Portugal», cadernos Maria da Fonte, 1974







 Tarrafal, Cabo Verde

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